28 agosto 2010

Raul não morreu

Vinte e um anos após a sua morte, Raul Seixas ainda mobiliza multidões

Cerca de duas mil pessoas participaram na tarde deste sábado, 21 de agosto, da passeata que percorreu a distância entre o Theatro Municipal e a Praça da Sé, em homenagem aos 21 anos da morte do cantor e compositor baiano Raul Seixas. Conhecida como “Passeata Raul Seixas”, o evento acontece desde 1990 no dia da morte do cantor e percorre tradicionalmente o mesmo trajeto no centro da cidade de São Paulo. 

Na manhã de sábado, muitos fãs já se concentravam em frente ao Theatro Municipal onde foi iniciado o consumo de bebidas alcoólicas e os primeiros acordes e gritos de “Toca Raul” já puderam ser ouvidos.

Às 18h, a multidão que se formou ao longo do dia seguiu rumo à Praça da Sé, atrás de um triciclo gigantesco, uma espécie de mini trioelétrico, pertencente a um dos principais covers de Raul, Penna Seixas, que durante todo o percurso dublou as músicas irradiadas pelos alto-falantes.

O público presente era heterogêneo. Fãs que acompanharam o trabalho do ídolo desde os primeiros discos misturam-se com adolescente nascidos após a sua morte. Além disso, o público do cantor não é composto apenas de “malucos-beleza”, entre camisetas pretas estampadas com o símbolo da Sociedade Alternativa, letras de músicas e fotos de Raulzito, é possível encontrar homens vestidos com roupas quase sociais e mulheres com trajes finos.

Opinião unânime entre os participantes: ser fã de Raul Seixas difere da idolatria por outros artistas. “As passeatas do Raul são incríveis. Não tem como descrever a sensação. Que outro artista consegue fazer isso?”, comenta Guilhernina Santos, 33, observando a multidão aglomerada em frente à Catedral da Sé, entre a música alta e gritos de “Raul! Raul! Raul!”

Outros gritos são ecoados durante a passeata, desde os tradicionais “Viva a Sociedade Alternativa” e “Toca Raul” até mensagens pouco elogiosas ao prefeito da cidade. O orgulho de estar fazendo aquilo em homenagem a um ídolo é perceptível e frases como “É Raullllll!” e “Isso aqui é só uma vez por ano” podem ser ouvidas em vários grupinhos.

Em meio à multidão, e sem destaque nenhum, estão as principais estrelas do universo raulseixista: Sylvio Passos, 46, paulistano que conviveu com Raul durante os últimos anos de sua vida e fundou do Raul Rock Club e Edy Star, 63, baiano que junto com Raul e outros três amigos gravou o LP Sociedade da Grã Ordem Kavernista apresenta: sessão das dez.

Com o passar das horas, a multidão vai dispersando-se. Rodinhas de amigos formam-se, cada uma com seus próprios violões, garrafas de vinho e latinhas de cerveja e máquinas fotográficas.

Entre as várias faixas e bandeiras expostas, uma dizia: “Eu vou-me embora apostando em vocês”. Trata-se de um trecho da música A geração da Luz, que traduz o espírito dos que participaram da passeata: dar continuidade a obra de Raul Seixas.
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25 agosto 2010

 O Guardião do Baú
Sylvio Passos, amigo e fundador do fã-clube oficial
de Raul Seixas, dedica sua vida a preservação da memória do ídolo

“As coisas do Raul sozinhas não fazem nada”. É com esse pensamento que o paulistano Sylvio Passos dedica a sua vida à conservação e promoção da obra do baiano Raul Santos Seixas. Sobrevive com o seu trabalho como produtor, o que lhe absorve integralmente o tempo, e não traz o retorno financeiro estimado por quem o observa lidando com a obra do pai do rock brasileiro.

Aos 17 anos, Sylvio Passos era apenas mais um fã de Raul Seixas. Foi nessa época que surgiu a ideia de montar um fã-clube para o ídolo. Por meio de um anúncio no jornal,  conseguiu o telefone da casa de Raul e resolveu ligar: “Alô, Raul? Aqui é o Sylvio...” e Raul lhe respondeu: “Sílvio? Sílvio Santos? Sim, eu aceito tocar no seu programa!”. Após desfazer a confusão, contou que pretendia fundar um fã-clube em sua homenagem e, surpreso, Raul o convidou para um almoço em seu apartamento, em São Paulo, local que Sylvio passaria a frequentar assiduamente durante os anos seguintes.

Hoje, aos 46 anos, Sylvio é a principal fonte quando o assunto é Raul Seixas. Foi a ele que Raul confiou o seu baú pessoal, recheado de todos os tipos de objetos – de cadernos escritos durante a infância a roupas e letras de músicas inéditas. “Nós éramos amigos e ele confiava muito em mim, me entregava tudo. Até o dinheiro dele ficava comigo”, conta. Além disso, seu acervo possui outros objetos que lhes foram doados pela mãe, pelas ex-mulheres e pelos amigos do cantor baiano.

Tido por muitos como o filho homem que Raul não teve, para explicar essa relação, Sylvio cita uma frase que escutou de Dona Maria Eugênia, mãe do Maluco Beleza: “Sylvio, Raulzito gosta demais de você e eu sei que você aprende muito com ele. Mas, mesmo sendo um garoto ainda, nunca se esqueça que ele também aprende muito contigo.“ A diferença de idade logo foi deixada de lado assim como a distância fã-ídolo.

Sylvio faz o que pode para manter viva a obra de seu grande ídolo e amigo: já produziu CDs com músicas inéditas, escreveu livros, incentiva e promove shows de covers, além de participar ativamente de comunidades virtuais e manter o “Raul Rock Club”, maior fã-clube do país, por quase 30 anos, tendo encerrado oficialmente as suas atividades em 2009 devido a confusões na justiça referentes aos direitos autorais.

Todo o seu acervo de material “raulseixista” faz parte da “Expo Raul”, exposição organizada por ele que viajou várias partes do país. “Raul não me entregou todo esse material para eu guardar em casa porque eu sou um fã-colecionador. O cara me passou uma grande responsabilidade e eu tenho que passar isso para frente”, deseja Passos.

Sylvio está envolvido atualmente com dois projetos: o lançamento do documentário “O início, o fim e o meio” do diretor Walter Carvalho, com estreia prevista para o mês de outubro, e no auxílio ao escritor Edmundo Leite, que há cinco anos pesquisa a vida e a obra de Raul para escrever biografia, tida como a mais minuciosa e detalhada publicada até hoje.